“Sinto que ainda tenho muito para dar ao Hóquei em Patins” é desta forma que Miguel Fernandes, mais conhecido por Micha, olha para o futuro e para a modalidade que abraçou há mais de 30 anos.
Miguel Fernandes, que começou no Hóquei em Patins com seis anos de idade no clube da sua terra, então denominado na Escola de Patinagem Novo Mundo, já conquistou muito no Hóquei em Patins. Foi Campeão Regional, representou as Seleções Regionais e Nacionais. Jogou no clube do seu coração (Benfica), no Óquei de Barcelos e em Espanha, entre outros clubes. Participou na Liga dos Campeões e na Taça CERS. Diz-se orgulhoso do seu percurso desportivo, mas garante que o que mais o satisfaz foi “ter deixado a minha marca e amigos em todos os clubes por onde passei”.
Fomos conhecer melhor Miguel Fernandes, o homem por detrás do jogador, quem é, e o que ambiciona. O jogador que se tornou treinador e presidente. Os sonhos que ainda tem no Hóquei em Patins.
MIGUEL FERNANDES, QUEM É
Nome: Miguel Cândido de Castro Fernandes
Idade: 39
Profissão: Gestor de equipa / Ramo imobiliário
Ambições/Sonhos: A nível pessoal todos os sonhos que tinha, praticamente, consegui realizar. Casar, construir a minha família, ter os meus filhotes, ter a minha própria casa, ter um emprego estável em que me sinto realizado, e sobretudo ser feliz diariamente junto dos meus.
DESPORTIVO DO MINHO: Quem é o Miguel Fernandes? Como se define?
MIGUEL FERNANDES: É difícil falar de mim próprio. Mas defino-me como uma pessoa humilde, genuína, com ideias muito claras e bem definidas. Sou muito focado nos meus objetivos e entrego-me por completo em tudo o que me envolvo. Às vezes penso que sou bom demais e acabo por sair “mal na fotografia”. Detesto hipocrisia e ingratidão. Privilegio a amizade verdadeira (bem rara por sinal), o reconhecimento e os valores verdadeiros. Sou uma pessoa de afetos, de família. Tenho muito orgulho da pessoa que sou.
DM: Como ingressou no Hóquei em Patins?
MF: Já lá vão muitos anos. Foi no ano em que entrei para a Escola Primária. Penso que alguém conhecido dos meus pais falou-lhes do Hóquei, levaram-me e nunca mais deixei. Como se costuma dizer foi “amor à primeira vista”.
DM: Que idade tinha?
MF: Tinha 6 anos.
DM: E porque o Hóquei em Patins?
MF: Como disse, fiquei completamente apaixonado desde o primeiro momento. Na altura gostava muito de futebol, também queria jogar. Os meus pais deixaram me decidir e optei pelo Hóquei em Patins.
DM: Como foi a carreira de jogador?
MF: Olhando para trás, penso que num ou noutro momento podia ter decidido de outra forma, em algumas escolhas. No entanto, orgulho-me muito do meu percurso, pela parte desportiva, mas, sobretudo, por ter deixado a minha marca e amigos em todos os clubes por onde passei.
Comecei na Escola de Patinagem Novo Mundo (atual Valença HC), onde estive até aos 15 anos. Depois ingressei nos Juvenis do OC Barcelos, onde permaneci dois anos (um nos Juvenis e outro nos Juniores). No segundo ano de Júnior fui para o SL Benfica. Joguei dois anos ali. Quando subi a Sénior renovei contrato com o SLB por dois anos, mas nos dois anos fui emprestado. No primeiro ano de Sénior ao FC Alverca e no segundo ao Nafarros, os dois na II Divisão Nacional. No ano seguinte voltei ao OC Barcelos, para representar os Seniores, onde estive dois anos. De seguida segui para Espanha, onde representei durante dois anos o Vigo Stick (na Primera Nacional, equivalente à II Divisão Portuguesa). Depois tive a minha primeira passagem pelo Limianos, na I Divisão, onde joguei uma época.
Depois seguiu-se todo o projeto Valença HC. Em apenas três anos chegamos à I Divisão. Permaneci ali oito épocas e meia. Por fim cheguei novamente ao Limianos, onde estive a última época e meia.
CAMPEÃO REGIONAL DE INFANTIS
DM: Qual foi aquele que consideras o ponto alto da carreira como jogador?
MF: O primeiro foi, sem dúvida, quando fui Campeão Regional de Infantis. Na altura com apenas nove anos, na Escola de Patinagem Novo Mundo.
O segundo foi quando cumpri o meu sonho de menino. Poder vestir a camisola do meu clube do coração, do SL Benfica, foi de fato mágico, único e indescritível.
Por fim, e talvez o momento mais alto da minha carreira como jogador, foi a subida à I Divisão com o clube da minha vida e da minha terra, o Valença HC.
DM: Quais as melhores experiências e as que te marcaram negativamente como jogador?
MF: Melhores experiências… Foram muitas, é complicado numerar as “melhores”. Como disse fui muito feliz em todos os clubes por onde passei, sem exceção. Posso destacar os títulos Regionais no Valença (era quase impensável na altura), a chegada às Seleções Regionais e Nacional, vestir a camisola do Benfica foi, como disse, um sonho de menino concretizado. Participar na I Divisão e na Liga dos Campeões com o OCB, e jogar naquele pavilhão cheio foi também marcante. E depois no Valença, também por todo o contexto, foram incríveis os vários momentos. A subida no primeiro ano à II Divisão, a subida à I, a presença na Taça Cers.
De forma mais negativa… Os momentos que me vão marcar para sempre, a nível pessoal, são a rotura de ligamentos do joelho e o arrepiante “acidente” que tive num jogo, em que fiquei com a boca demasiado maltratada, ambos no Valença. Foram momentos e meses muito longos e duríssimos, mas que com muita resiliência consegui superar. A nível coletivo, sem dúvida que me marcaram as dificuldades financeiras na segunda época do Vigo Stick e a descida da I Divisão com o Valença.
A PRIMEIRA EXPERIÊNCIA COMO TREINADOR
DM: Como surgiu a oportunidade de também começar a treinar?
MF: A primeira experiência como treinador foi no Valença Hóquei Clube. Na altura morava e jogava em Vigo e o Armando e a Sónia (que estavam à frente do Clube) convidaram-me.
DM: Como foi dividir-se entre jogar e treinar? Que idade tinhas quando o começaste a fazer?
MF: Tinha 23/24 anos. Na altura deu para conciliar porque estava a jogar no Vigo Stick e eramos, praticamente, profissionais, não treinávamos à noite. Assim conseguia conciliar para ir dar os treinos a Valença e os jogos conseguíamos adaptar
DM: O que o cativa mais: jogar ou treinar?
MF: Pergunta difícil de responder. As duas coisas fascinam-me. São praticamente 33 anos a jogar e a paixão e a adrenalina pelo jogo têm uma força em mim difícil de contrariar. Mesmo com a idade que tenho, aquele nervosinho do jogo, a vontade de ir treinar, a vontade de ganhar, estão sempre ali. É complicado.
Treinar é diferente. Mas algo que me cativa de forma extraordinária e me faz querer ser cada vez melhor. É sentir-me capaz de transmitir conhecimento, é querer que os jogadores se revejam em nós e nas nossas ideias, é sentir que tudo o que aprendi ao longo da minha carreira me foi útil e pode contribuir para fazer o atleta ser melhor.
DM: O que é para ti mais importante como jogador? E treinador?
MF: Acho que o mais importante é comum a ambas as funções. Um jogador tal como um treinador deve ser trabalhador, dedicado, focado e ao mesmo tempo profissional, disciplinado, humilde e respeitador. É ser consciente das suas capacidades, mas querer sempre mais e melhor. É admitir as suas dificuldades e os seus erros, analisando, identificando e corrigindo. É ser ativo e nunca se sentir satisfeito, mesmo tendo sucesso.
É preparar-se, em ambas as funções, diariamente, para os desafios e dificuldades que surgem pela frente.
A MINHA AMBIÇÃO É TREINAR UMA EQUIPA SÉNIOR
DM: Como treinador já estiveste à frente de vários escalões… o que gosta mais? Quais são os principais desafios?
MF: Sim, como treinador o meu trabalho foi transversal a todos os escalões. Já treinei de Escolinhas de Formação a Seniores. O desafio sempre foi muito grande e o meu trabalho e dedicação não se alteram em nada.
Sou um treinador que privilegio a relação sincera e profissional com o atleta. Que privilegia o incentivo, mas não descarta nem coloca de parte a repreensão assertiva e no momento certo.
Nesta altura da minha vida, a minha preferência recai em escalões mais altos. De preferência Seniores. Não escondo que a minha ambição é treinar uma equipa Sénior. Tenho-me vindo a preparar ao longo dos anos e continuarei a fazê-lo para poder ter a minha oportunidade e mostrar o meu valor. Acho que quer o desafio quer a responsabilidade são maiores. A relação inter-pessoal é fundamental. A liderança é colocada à prova. Gosto disso. Gosto de pressão. Gosto do desafio de ter de fazer escolhas difíceis e te ter de colocar homens a seguir os meus ideais e princípios de jogo.
DM: Quais as ambições que ainda tem no Hóquei em Patins? O que te leva a querer continuar ligado à modalidade?
MF: Sinceramente… Sinto que ainda tenho muito para dar ao Hóquei em Patins. Aliás com toda a humildade do Mundo, a nossa modalidade precisa de uma renovação, precisa de pessoas (diretores, treinadores, coordenadores) que tenham noção do que é o Desporto. Que sejam uma mais-valia.
Reforçando um pouco do que disse na resposta anterior, tenho uma ambição enorme de continuar a preparar-me, como tenho vindo a fazer, para ser melhor treinador, e sim para poder ter a oportunidade de mostrar o meu real valor e o meu potencial. Não quero “queimar etapas”, nem sonhar demasiado alto, mas tenho ambição e noção de que um dia posso chegar a ser treinador da I Divisão.
FOI UMA ÉPOCA MUITO INTENSA… ACABA POR SER UM POUCO FRUSTRANTE
DM: Esta foi uma época intensa…. Que balanço fazes como jogador e treinador, em que te sagraste Vice-Campeão?
MF: Já é publico que não vou continuar ligado ao Limianos. Mas sim, foi uma época muito intensa. Acaba por ser um pouco frustrante.
Acabamos por “morrer na praia” quer nos Sub-23, quer na equipa Sénior.
Nos Sub-23, um projeto feito sem grande planeamento, sem objetivos traçados que não fossem os atletas jogar e ter minutos, conseguimos algo impensável: fomos Vice-Campeões Nacionais. Um grande feito, com todo o mérito dos atletas! Não fizemos um único treino durante toda a época do escalão, tudo o que conseguimos foi pela química alcançada entre mim e os jogadores, e claro mérito deles, por toda a qualidade, dedicação e compromisso demonstrados. Parabéns a todos mais uma vez.
Na equipa Sénior, durante a fase do campeonato, mesmo tendo estado em primeiro lugar durante muitas jornadas, acabamos por perder, por culpa própria em momentos decisivos, que acabaram por nos afastar do primeiro lugar. Depois acabamos por ir ao Play-off de subida, em que é público o que aconteceu na última jornada. A verdade desportiva não existiu. E podíamos ter subido, que era o principal objetivo. Em suma, a equipa teve grandes momentos, mas falhamos em momentos chave. Uma equipa que quer subir de divisão não pode falhar em momentos decisivos. Tem de ser mais profissional nas suas abordagens aos momentos. E acabamos por claudicar.
DM: O que te marcou mais este ano?
MF: Sem dúvida nenhuma a experiência como treinador dos Sub-23. Vai marcar o meu percurso como treinador!
Como disse, enquanto treinador não treinei uma única vez em toda a época com a equipa na sua totalidade (os atletas treinavam com os seniores). Jogadores com falta de confiança, com pouquíssimos ou nenhuns minutos na equipa Sénior, jogo a jogo fomos conseguindo crescer, ganhando confiança e acabamos por atingir um patamar de excelência. A classificação final fala por si.
Foi uma experiência soberba e a ligação com os atletas foi muito enriquecedora. Enquanto treinador foi fantástico ver a evolução e performance de alguns atletas.
PRESIDENTE… FOI A EXPERIÊNCIA DE UMA VIDA
DM: Na tua carreira há ainda outra faceta… a de presidente do clube da tua terra? Como foi a experiência? Voltavas a assumir o Valença HC como presidente?
MF: Foi a experiência de uma vida. Acho que isso fala por si.
Assim como os resultados falaram por si. Foi incrível, difícil, mas muito gratificante. Infelizmente vivemos numa sociedade em que a memória das pessoas é muito curta.
Valeu a pena, por tudo o que conseguiu alcançar, fez-se história.
Mas não. Não voltaria a assumir um cargo de Presidente. Nem no Valença nem noutra qualquer instituição. Foi o momento. Um momento bonito, mas que é apenas isso. História.
DM: E como foi ser presidente, treinador e jogador na mesma época?
MF: Ainda há dias que penso nisso. Era de loucos. Mas possível na altura porque também tinha pessoas junto a mim que permitiam que tal fosse exequível.
DM: O que, se pudesses, mudavas nesta tua ligação ao Hóquei em Patins?
MF: Sinceramente, nada. Se calhar em alguns momentos, como disse, não tomei as melhores decisões. Mas todos os momentos de felicidade ao longo de todos estes anos compensam tudo o que de menos bom aconteceu. E o mais importante de tudo, sinto muito orgulho, hoje em dia, de ir a qualquer pavilhão, de norte a sul, e ser reconhecido e sobretudo respeitado. Isso e as amizades foram maiores conquistas que tive no Hóquei em Patins.